A sexualidade é de grande complexidade, por envolver diferentes aspectos, físicos, psicológicos, relacionamento comportamental e interpessoal. Atualmente, a qualidade de vida e a função sexual se tornaram muito importantes, em pacientes com câncer.
Vários tipos de cânceres e seus tratamentos podem causar disfunção sexual (DE). Com a evolução das técnicas cirúrgicas, a melhora da qualidade das drogas utilizadas na quimioterapia e das modernas técnicas de radiação, mais pacientes podem ser tratados com sucesso, sem comprometer a função sexual.
O tratamento do câncer, preocupando-se apenas com a cura da doença, pode resultar na suposição que a atividade sexual não é importante para estes pacientes e seus parceiros, mas isto não é a realidade. O câncer afeta o tempo e a qualidade de vida, sendo que o maior desafio para os médicos é tratar ambos os componentes com compaixão.
Apesar da diminuição global na incidência da mortalidade do câncer, avaliada em países desenvolvidos desde os anos 90, o câncer permanece como um dos principais problemas de saúde pública. A probabilidade de se desenvolver um câncer é mais alto em homens (46%) do que em mulheres (38%). Nos homens, os mais comuns são o câncer de próstata, pulmão, cólon e reto. Estes ocorrem com maior freqüência, em populações com maior idade, mas mesmo nas idades mais avançadas, os homens continuam com interesse no sexo.
Diferentemente de muitos outros efeitos colaterais do tratamento do câncer, os problemas sexuais podem não ser resolvidos nos primeiros anos pós-tratamento, assim interferindo no retorno de uma vida normal com qualidade.
FATORES RELACIONADOS COM ALTERAÇÃO NA FUNÇÃO SEXUAL:
Tratamento Cirúrgico
A cirurgia pode afetar diretamente a função sexual, sendo que isto está relacionado com a idade, localização e tamanho do tumor e o grau de invasão local. As cirurgias das neoplasias, que provocam DE, incluem as cirurgias sobre o colo e reto, próstata, bexiga e outros tumores pélvicos.
Tratamento Quimioterápico
A quimioterapia está associada com a diminuição do desejo e da atividade sexual. Os efeitos adversos deste tratamento mais freqüentes são: náuseas, vômitos, diarréia, emagrecimento, alopécia e diminuição da auto-estima pessoal. Geralmente, a quimioterapia interfere na produção de testosterona pelos testículos, levando a uma redução na atividade sexual.
Tratamento Radioterápico
Como a quimioterapia, a radioterapia pode causar efeitos colaterais como fadiga, náuseas, vômitos, diarréia e outros sintomas que podem diminuir o desejo sexual.
No homem a radioterapia pode provocar impotência devido a lesão neurológica, diminuição do fluxo sanguíneo do pênis e diminuição dos níveis hormonais de testosterona.
Tratamento Hormonal
A hormonioterapia para o câncer de próstata pode diminuir os níveis hormonais e causar uma diminuição no desejo e no desempenho sexual. Alguns esquemas terapêuticos de tratamento hormonal são feitos de forma intermitente tentando preservar a função sexual, principalmente em homens jovens.
Neoplasia Colo-retal
As disfunções erétil e vesical são as complicações mais freqüentes da cirurgia para neoplasia do cólon e do reto. Podendo causar problemas na ereção, orgasmo e ejaculação; devido a lesão dos nervos pélvicos. Os nervos do plexo hipogástrico inferior são responsáveis pela ereção e os do plexo hipogástrico superior pela ejaculação, mediados pelo sistema simpático.
A padronização das técnicas operatórias, com o conhecimento da neuroanatomia pélvica, é necessária para a preservação da inervação, sendo fundamental para preservar a qualidade de vida após a cirurgia. Mesmo assim, o paciente deve ser informado antes da cirurgia, sobre a possibilidade de tornar-se impotente após a cirurgia para o câncer retal.
Neoplasia da Próstata
Avanços na detecção e tratamento de câncer de próstata têm aumentado muito a chance de sobrevivência de muitos pacientes. Os tratamentos atuais para a doença incluem a prostatectomia radical, radioterapia externa e a braquiterapia. Estes tratamentos são bastante efetivos do ponto de vista oncológico, mas trazem efeitos secundários para o paciente e sua qualidade de vida. O Câncer de próstata é a neoplasia mais comum no homem adulto. Os tratamentos utilizados normalmente causam comprometimento da função erétil peniana. Algumas opções de tratamento podem ajudar na recuperação da função sexual. Inicialmente com a melhora na técnica de prostatectomia radical com a utilização da preservação do feixe vásculo-nervoso, propicia um maior número de pacientes com função sexual preservada no pós-operatório.
A radiação produz DE por causar alterações microvasculares aceleradas, causando fibrose ou alterações do lúmen de artérias e incrementando a evolução da aterosclerose existente, levando a insuficiência arterial. Evidencias mais recentes demonstram que estas alterações vasculares levam à mudanças estruturais nos músculos lisos dos corpos cavernosos, traduzindo-se em uma disfunção do endotélio. Estudos demonstram que não há diferenças entre a incidência de DE após o tratamento cirúrgico e a radioterapia. A alteração da função erétil está diretamente ligada à dose de radiação e o modo de administração, se com aplicação externa ou pela braquiterapia.
A prostatectomia radical, atual tratamento gold standard para o câncer de próstata, causa disfunção erétil de imediato ao tratamento, com lesão dos feixes neurovasculares. Tem retorno da função erétil de forma bastante variável, podendo ocorrer em 68 % dos pacientes que tinham boa função pré tratamento e que tiveram preservação dos feixes bilateralmente e quando a preservação é unilateral, o índice fica em torno de 47%.
A estimulação da ereção com drogas vasoativas de uso intracavernoso, como a papaverina, fentolamina, prostatglandina e suas associações, também ajudam a recuperar ou facilitar a ereção peniana nestes pacientes. Mas o advento dos medicamentos orais como os inibidores da fosfodiesterase é que tem demonstrado boa recuperação da função erétil no pós-operatório. Quando nenhum outro tratamento apresenta resultado, devemos utilizar o implante de prótese peniana. (15)
Em estudos demonstrou-se uma melhor recuperação, em até 40 % da função erétil pós tratamento, com a interposição de enxerto sobre o nervo íleo inguinal, durante a prostatectomia radical.
Neoplasia da Bexiga
O tratamento mais adequado para pacientes com câncer de bexiga invasivo é a cistectomia radical com a substituição da bexiga, este procedimento cirúrgico provoca DE, em 84% dos pacientes.
Neoplasia Peniana
O carcinoma do pênis é raro, compreendendo menos de 1% de todos os cânceres masculinos. O tratamento convencional é a amputação total ou parcial com ou sem radiação.
Os pacientes que foram submetidos à penectomia parcial não apresentaram melhor desempenho sexual em comparação aos pacientes com penectomia total.
Neoplasia Testicular
Os tumores de célula germinativa dos testículos são relativamente raros, sendo aproximadamente 1% de todos os cânceres masculinos. A incidência deste tumor aumentou nas últimas duas décadas.
O câncer testicular pode ser classificado histopatologicamente em seminomas, não-seminomas e tumores combinados. Após a orquiectomia, o tratamento pode ser combinado com radioterapia, quimioterapia e linfadenectomias ilíacas e retroperitoniais, dependendo do tipo histológico e estádio da neoplasia.
As alterações sexuais mais encontradas são orgasmo seco, ejaculação retrógrada, disfunção erétil e diminuição da auto-estima pela ausência dos testículos, devendo o urologista oferecer sempre a opção do implante de prótese testicular pois, a maioria dos pacientes fica muito satisfeita com o resultado estético.
Conclusão
A disfunção sexual nos pacientes masculinos com câncer pode resultar de fatores biológicos, psicológicos e sociais. Fatores biológicos tais como alterações anatômicas (amputação do reto, amputação peniana), as mudanças fisiológicas (nível hormonal) e o efeito secundário da intervenção médica, podem impossibilitar uma função sexual normal, mesmo quando o desejo sexual esteja intacto.
Efeitos colaterais do tratamento, tais como náusea, vômito, fadiga, perda do cabelo, podem resultar em efeitos adversos na sexualidade, junto com a desfiguração da cirurgia. Estados emocionais negativos tais como a ansiedade, depressão e a raiva podem interromper a atividade sexual. Os distúrbios da imagem do corpo podem contribuir ao desenvolvimento da disfunção sexual, como a orquiectomia é exemplo.
Outros fatores psicológicos também podem contribuir para a disfunção sexual, como as dificuldades financeiras e mudanças ocupacionais.
A avaliação da função sexual em uma população com câncer, é complexa, pois existem vários fatores específicos da patologia, psicológicos e sociais. Em tratamentos oncológico é altamente recomendados uma equipe multidisciplinar com médicos, psicológicas e sexólogos para lidar com a saúde e a sexualidade do paciente.